Feira do Livro cancela participação de Míriam Leitão.

Me deparei, estarrecida, com essa notícia. Principalmente quando soube o motivo do cancelamento.
A feira, que está em sua décima terceira edição, acontece na cidade catarinense de Jaraguá do Sul. O organizador conta que, ao divulgar os nomes dos convidados, recebeu inúmeros telefonemas, mensagens e uma petição com cerca de três mil assinaturas com ameaças a escritora e exigindo o cancelamento da participação. Míriam Leitão foi convidada para falar sobre seus livros e afins. A escritora tem vários livros publicados, em alguns a temática nos remete ao período da ditadura militar no Brasil, como por exemplo em “Tempos extremos”. Mas também tem alguns infantis, como “A perigosa vida dos passarinhos pequenos” e “Flavia e o bolo de chocolate”.

 

 

Confesso que li com muita tristeza e grande preocupação essa notícia. O que está acontecendo no Brasil? Por que estamos assistindo diariamente cada vez mais pessoas sendo impedidas de se expressar, de ter voz? Me lembro no segundo governo Dilma, toda vez que a presidente ia fazer um pronunciamento tinha um “panelaço”. Temos visto também vários casos de perseguição às minorias, aos professores, aos jornalistas, aos escritores… E muitos seguem aprovando essas manifestações autoritárias. Me pergunto em nome de quê? Ou por quê? As pessoas estão cheias de certezas absolutas e estão esquecendo do quão importante é para a vida em uma sociedade democrática, plural, o convívio harmonioso com as diferenças, o contraditório e como isso enriquece o aprendizado e a formação de cada um.

Você pode não concordar com as opiniões e posturas dessa ou daquela pessoa, mas não impedi-la de falar, de se expressar. Não podemos desacreditar ou desmerecer alguém só porque não concordamos. Desacreditar pessoas, obras ou instituições só para fazer valer ou prevalecer uma única opinião é um caminho perigoso para a vida em uma sociedade democrática. No caso desse cancelamento da visita foi utilizado o expediente do medo e da ameaça com o objetivo de calar pouco a pouco e cada vez mais qualquer voz dissonante.

 

Para ilustrar essa forma de atuação, vou lançar mão de uma comparação que pode ser considerada até simplória para muitos, mas ainda é muito eficaz. Quantas mulheres já foram assediadas no transporte público? Vocês já presenciaram uma situação em que a mulher grita, denuncia e o homem a ridiculariza, diz que ela é feia e que não tem interesse e etc? Pois é, essa dupla agressão, física e verbal, já fez (e ainda faz) com que muitas mulheres não denunciassem o abuso, por medo, vergonha, falta de apoio. E os agressores seguem suas vidas normalmente, livres para seguir importunando outras vítimas.

Enfim, você que, talvez, diga que todas essas situações estão corretas, pode estar caminhando para ter sua voz silenciada um dia também. Quem garante que você estará sempre do lado daquele que faz calar, daquele que não deseja ouvir ninguém? Você também pode se calar um dia por medo, vergonha ou qualquer outro sentimento. Pense nisso.

Se você não concorda ou não está a fim de escutar a palestra da escritora, não era mais simples apenas não prestigiá-la com a sua presença? Essa, talvez, seja uma resposta mais contundente para aqueles que se dispõem a falar em público.

Cada ação ou atitude nossa gera consequências. Pensemos e reflitamos sobre isso com mais seriedade, menos paixão e mais razão. Afinal, qual é o tipo de país que você quer viver? Um país com instituições sólidas e direitos civis assegurados ou um país em que valha a lei do mais forte ou de quem grite mais?

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