CRÔNICA DO DIA: O CAFÉ.

A empresa havia comprado uma máquina nova de café. Os funcionários ficaram eufóricos. “Será que o café dessa máquina é melhor do que o da outra?”, perguntavam-se. A ansiedade dissipou-se logo após a instalação. As tais máquinas ofereciam três tipos de café – suave, forte e tradicional. Todos estavam encantados com a novidade e a variedade das opções oferecidas. 

Passada a empolgação inicial, começaram os comentários a respeito do café. Uns acharam fraco. Outros forte. Outros levantaram a questão da higiene da engrenagem. Outros ainda, alegaram que a água utilizada pela máquina não estava própria para o consumo. Enfim, a máquina de café era o assunto predileto da chamada “rádio corredor”. E as manchetes das matérias dessa rádio, tão popular em ambientes corporativos, não eram nada boas… 

Foi então que alguém levantou a voz para trazer uma solução que pretendia salvar os paladares mais apurados no quesito “café”. “Que tal comprarmos uma cafeteira com os nossos próprios recursos e fazermos o nosso próprio café?”, sugeriu uma voz. A ideia foi simpática a muitos e nos dias que se seguiram a movimentação foi grande para alcançar o novo objetivo da equipe. Pesquisa aqui, pesquisa ali. Por fim, encontraram uma “maravilhosa”, que atenderia a todos magnificamente. Iniciou-se o rateio. Todos os participantes da nova empreitada colaboraram.


Finalmente, ela chegou! A animação foi geral. Todos queriam estrear o novo “brinquedo”. Sim, brinquedo. Pareciam crianças diante de um novo presente, que há muito sonhavam. Estabeleceram regras para o uso, como quem faria o café, quem limparia a engrenagem, quem compraria o pó de café, o açúcar e por aí vai. A empolgação só aumentava. As tardes ficaram até mais doces. Bolos eram comprados para acompanhar e dar mais sabor ao momento do cafezinho. Imaginem o cheiro prazeroso que invadia o ambiente, quando chegava a hora do café. Um aroma convidativo, posso garantir!

Tudo ia bem, até que velhos costumes começaram a vir à tona. Os homens foram deixando de mansinho a tarefa de fazer o café. Vez ou outra, um deles aventurava-se na função e ainda se autoelogiava, afirmando que “o seu café sim, era café de verdade”, mesmo que ele só o fizesse esporadicamente. Como somente as mulheres passaram a dividir a tarefa, iniciou-se, entre elas, uma vigília para ver quem estava colaborando. Começou o disse-me-disse. Ouvia-se a “boca pequena” coisas do tipo “fulana nem encosta na máquina para fazer o café e ainda tem a cara de pau de perguntar se tem café fresco logo que chega”. “Mas que café ruinzinho. Não sei como uma pessoa assim se diz dona de casa”. “Não sei não, mas acho que não vou participar mais do rateio, só eu faço café”. “Se eu não chegar cedo, não tem café”.

E o que era um prazer inenarrável começou a desencadear atritos. As pessoas entreolhavam-se com ar indisposto. Antigas antipatias começaram a vir a tona e com isso, um depois outro foi desistindo da empreitada e retornaram para a máquina de café, que mantinha-se pacientemente firme aguardando seus clientes. 

Os dias transcorriam felizes e laboriosos. A máquina de café voltou a ativa freneticamente. Durante um tempo… Não muito. Até que alguém começou a notar certas imperfeições naquele café tão… “Mecânico”! “Esse café é tão sem gosto!”, dizia um. “Muito forte esse café”, dizia outro. De repente, alguém notou em um cantinho da bancada a esquecida e empoeirada cafeteira e teve uma brilhante ideia: “pessoal, por que não usamos a cafeteira para fazer nosso próprio café?”, sugeriu o criativo funcionário. As pessoas gostaram da sugestão e começaram a estabelecer os regulamentos para o uso. Assim, mais uma vez, a máquina de café entrou de férias. Férias? Sim, férias. Já, já, ela volta ao trabalho. 

8 comentários em “CRÔNICA DO DIA: O CAFÉ.

  • quarta-feira, 16 de março de 2016 em 16:29
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    Mas que agonia essa troca troca de máquina de café e cafeteria.Isso mostra como as pessoas estão sempre enjoando das coisas. Nitinha.

  • quinta-feira, 17 de março de 2016 em 02:42
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    Em grupo as pessoas agem, muitas vezes,por empolgação…aí dá nisso. Me diverti lendo, parecia participar da história. Adorei! Rozi.

  • sexta-feira, 18 de março de 2016 em 23:34
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    Lendo a história me senti funcionária desta empresa. Quantas situações parecidas já vivemos, satisfações e insatisfações, diferenças entre as pessoas e o que valorizam e por aí vai….. Muito bom o texto! Bjs Cláudia

  • sábado, 19 de março de 2016 em 01:48
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    Muito boa sua crônica! Os ambientes mudam, mas as questões do dia-a-dia só mudam de endereço.
    Bjs. Ana Costa

  • segunda-feira, 21 de março de 2016 em 13:34
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    Fátima, ao ler essa bela crônica acredito que assim como "O Café" várias atitudes similares temos em relação a várias coisas nas nossas vidas…você usou muito bem essa crônica para mostrar na verdade como o ser humano é volátil, como desiste fácil das coisas, como não persiste, como não insiste em acertar e/ou fazer diferente e principalmente como se "contamina" com as vibrações negativas e por qualquer dificuldade…..PARABENSSS por demonstrar tudo isso dessa forma tão simples e verdadeira!!!
    Beijos e sucesso sempre
    Crisinha

  • quarta-feira, 6 de julho de 2016 em 00:45
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    Gostei do texto! Tudo que é novo acaba chamando a atenção, até que passa a perder a graça. Muitas vezes o café é o mesmo e quem mudou mesmo foram as pessoas.
    Abraços

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