CRÔNICA DO DIA: LEMBRANÇAS DA MINHA MÃE!

Minha mãe era uma peça mesmo! Uma
peça rara de dignidade, responsabilidade, seriedade e comprometimento. Aluna
nota dez, não perdia uma aula, nem deixava de fazer nenhuma tarefa escolar.
Diziam que ela era um gênio. É verdade. Era um gênio mesmo. E muito comportada.
Sempre. Mas um dia… Um dia… Lá pelos anos 40, quando estudava para ser
professora, ela resolveu seguir suas colegas de classe em uma grande aventura.
Sim, uma grande aventura. Ao menos para minha mãe, a Anninha, como era chamada
carinhosamente pelas amigas. Elas iriam “gazetear” a aula naquele dia. Esse era
um grande acontecimento na vida da minha sempre comportada mãezinha. E assim
elas foram para a sua grande aventura, que incluía passear pelas ruas do Centro,
tomar sorvete e conversar. Minha mãe nem conseguiu se divertir muito, pois
tamanha era sua preocupação em ser vista por algum conhecido fazendo algo tão “ilícito”!

Minha mãe jamais se esqueceu
desse episódio, que também nunca mais se repetiu. Na velhice, quando a memória,
tão brilhantemente utilizada durante toda a sua vida, começou a lhe pregar
peças, o episódio veio à tona novamente. Estávamos as duas fazendo um
lanche, à tarde, em casa, quando ela resolveu me contar essa grande aventura.

“Tive tanto medo!” – disse ela ao
finalizar a narrativa.
– Do que mais sentiu medo, mãe? –
perguntei.
– De que alguém me visse. A Anna
gazeteando aula! Imagina! – comentou.

Sorri com os lábios e com o
coração para a minha querida e comportada mãezinha. E foi aí que a surpresa
chegou. Ela começou a contar novamente o caso, com as mesmas palavras e a mesma
entonação de minutos atrás. Minha surpresa não foi percebida por ela, que
continuou a narrativa. Por fim, disse: – “Tive tanto medo!” – concluiu. Mesmo
surpresa com o inusitado da situação, pensei rapidamente e decidi, em uma
fração de segundos, seguir o mesmo roteiro da conversa anterior travada minutos
antes e falei: 

– Do que mais sentiu medo, mãe?


Sua resposta foi a mesma.
Segundos depois ela começou a
contar a história novamente. Pela terceira vez. Em apenas vinte minutos. Não
preciso dizer que as palavras e expressões foram exatamente idênticas às
utilizadas nas narrativas anteriores. Parecia que havíamos apertado alguma
tecla, que nos levava sempre ao mesmo ponto da história.
Ao final de mais uma narrativa da
mesma cena, decidi mudar o roteiro e ir para a próxima cena. Levantei da mesa,
beijei a sua testa carinhosamente e disse:

– Vamos sentar no sofá agora para
descansar um pouquinho do lanche?

Ela concordou e levantando-se
devagar, com a dificuldade própria da idade, acompanhou-me de mãos dadas até o
sofá, onde iríamos conversar mais um pouquinho sobre suas grandes aventuras de
outrora. 

Minha Mãe querida, linda e serena, à mesa dos lanches e bate-papos.
UM FELIZ DIA PARA TODAS AS MÃES !

23 comentários em “CRÔNICA DO DIA: LEMBRANÇAS DA MINHA MÃE!

  • domingo, 11 de maio de 2014 em 12:53
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    Minha mãe querida e muito amada, perdoe se não fui a filha que você merecia, mas continuo te amando imensamente.Aonde estiver tenha um feliz dia das mães, sei que está em um lugar bom e especial.Nitinha.

  • segunda-feira, 12 de maio de 2014 em 12:31
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    Por vezes gostaríamos de viver eternamente um momento, uns instante. As vezes os deuses atendem nossas preces e não sabemos. Saudades são lembranças de momento bem vivido, e se foi vívido, nunca há de ser esquecido.
    Feliz dia das Mães a ti e todos as mães pretéritas, futuras mas sempre presentes nos corações.

    • segunda-feira, 12 de maio de 2014 em 12:45
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      É verdade, Erick Santos, comentei sobre esse fato dia desses com uma amiga. Eu acredito que, muitas vezes, nossa memória apaga certas emoções ruins para nos proteger de maiores sofrimentos. E em outras ela não nos deixa esquecer os fatos que nos marcaram. São os mistérios da nossa alma.
      Obrigada por seu comentário e pelas felicitações pelo Dia das Mães!
      Um grande abraço!

  • segunda-feira, 12 de maio de 2014 em 20:09
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    Ontem senti muita falta "das mães" que passaram pela minha vida, uma me deu a vida outra me criou, mas nesse dia lembro das duas com muti carinho e dou graças a Deus por ter tido a oportunidade de ser filha, irmã e hoje mãe. Linda narrativa em homenagem a sua mãe!! Bjus Fatima, saudades

    • segunda-feira, 12 de maio de 2014 em 20:14
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      Leila, que saudade!!! Obrigada por seu comentário! Que bom que temos tão grandes e prazerosos momentos para lembrar ao lado das nossas queridas mães. Um beijo grande e mais uma vez… FELIZ DIA DAS MÃES para você!

  • terça-feira, 13 de maio de 2014 em 17:50
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    Belo e comovente texto. Com gratidão à vida, ainda tenho minha maravilhosa mãe a meu lado. Costumo dizer que dentre as poucas qualidades que tenho, a maioria aprendi e fui inspirado por ela. Sou privilegiado por ser filho de quem sou, pois ela, certamente, com sua presença e seu exemplo, torna o mundo e as pessoas bem melhores.

    • terça-feira, 13 de maio de 2014 em 18:10
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      Fico feliz por você, Claudio Faria, que ainda pode desfrutar da companhia de sua mãe. Como você, minha mãe também foi um grande exemplo para mim e igualmente me sinto privilegiada de ser filha da Anninha.
      Obrigada por seu comentário!
      Um grande abraço!

  • terça-feira, 13 de maio de 2014 em 19:10
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    Que saudade da dona Anna. Lembro bem dela, serena, cheia de paz, de fala mansa, tão carinhosa! Linda homenagem Fátima, fiquei emocionada e não pude conter as lágrimas. Saudades de você também, muitas.

    • terça-feira, 13 de maio de 2014 em 19:27
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      Que bom te ver por aqui, Mônica!!! Estou muito feliz em te reencontrar! Bom saber que minha mãe querida também lhe deixou tão boas lembranças. Também sinto muitas saudades!
      Obrigada por seu comentário afetuoso e cheio de carinho!
      Um grande beijo!

  • quinta-feira, 15 de maio de 2014 em 12:00
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    Muito bonito, Fátima, parabéns!! Bonito, emocionante e nos traz, de alguma forma, um sentimento de paz interior!! Abraços.

  • quinta-feira, 15 de maio de 2014 em 12:01
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    Muito bonito, Fátima, parabéns. Bonito, emocionante e nos traz, de alguma forma, um sentimento de paz interior. Abraços, Alexandre Coutinho

    • quinta-feira, 15 de maio de 2014 em 12:08
      Permalink

      Obrigada, Alexandre, por suas palavras! Fico feliz que o texto tenha lhe proporcionado esse sentimento de paz. O assunto é delicado e muitas pessoas vivenciam esse problema com os seus familiares. Problema esse que os deixa, muitas vezes, tristes com a situação daqueles que mais amam. Quis compartilhar minha experiência como uma forma de dizer que não estamos sós e que o amor é, de fato, a chave para encararmos os problemas da vida.
      Mais uma vez obrigada por seu comentário!
      Um grande abraço!

  • segunda-feira, 19 de maio de 2014 em 15:09
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    Olá, Fatinha !
    Realmente é comovente !
    Raros momentos e inesquecíveis, que todo bom filho relembra com muita saudade!!!!
    Gostaria de ler sobre a continuação da conversa que me prendeu atenção e me deu um pouco de curiosidade.
    Bjs,
    Rita de Cassia

    • segunda-feira, 19 de maio de 2014 em 18:20
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      Que bom, Ritinha, que gostou! Quanto a continuação da conversa, quem sabe em uma nova crônica… Quem sabe…
      Beijinhos,

  • segunda-feira, 19 de maio de 2014 em 17:02
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    Que gracinha, o João Pedro deve ter puxado algo da D. Anna, não?
    bjs
    Sandra Ronca

    • segunda-feira, 19 de maio de 2014 em 18:22
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      Com certeza, Sandra Ronca! A inteligência e sagacidade são marcas fortes em ambos. E, acima de tudo, são meus amores!!!
      Um grande beijo!

  • quarta-feira, 28 de maio de 2014 em 01:13
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    Ler sobre Dona Anna me fez relembrar a infância, principalmente do colégio onde estudamos. Época tão gostosa da minha vida. Obrigada pelo belo presente de dia das Mães. Saudades. Beijos, Vera

    • quarta-feira, 28 de maio de 2014 em 11:13
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      Ah, Verinha, que bom lhe ver por aqui! Fico mais feliz ainda em saber que a minha querida mãezinha traz tão boas lembranças às minhas amigas de outrora e de sempre. Que bom que gostou do meu presente de Dia das Mães! Um grande beijo!

  • quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016 em 13:18
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    Linda narrativa. Identifiquei-me com a maneira de ser de sua mãe. Era sempre séria e comportada e não consegui jamais burlar alguma "lei", rsrs.
    Esse é o maior pavor da velhice-a perda da memória, pra mim, o fim da existência. Vc teve grande sensibilidade diante de uma manifestação tão devastadora. Bjo.

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