CRÔNICA DO DIA: EDUCAÇÃO OLÍMPICA.
No último sábado estive no Colégio de Aplicação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, o CAp-UERJ, que está com suas atividades paralisadas por conta da greve dos funcionários e servidores do estado.
Ocupado pelos estudantes há pouco mais de um mês, é triste ver o colégio, um dos mais conceituados do Rio, sem o efetivo de estudantes que deveria estar lá. Mas os “ocupantes” tentam dar lições de resistência e cidadania. Digo resistência, pois é preciso muita força de vontade para encarar a precariedade das instalações da unidade, que funciona provisoriamente onde antes funcionou um hospital. Como o provisório acabou virando permanente, por conta da falta de interesse das autoridades, quem estuda ou trabalha no local foi tentando se adaptar ao ambiente que não oferece uma saída alternativa em caso de incêndio, não conta com os requisitos necessários de acessibilidade e também não oferece a merenda escolar gratuita, como deveria ser, já que o colégio é público. Em vez disso, o que vi foi uma montanha de entulho de uma obra que sequer começou e que era a promessa do tão desejado e sonhado bandejão do CAp.
Apesar de todo o desalento ao observar as instalações físicas da unidade, me impressionou a qualidade da ocupação pelos adolescentes. Confesso que quando soube da ocupação, fiquei reticente e preocupada com os estudantes dentro da escola, sozinhos, sem nenhum tipo de disciplina institucional ou supervisão. Mas eles deram um exemplo de engajamento em defesa da sua escola. A ocupação do CAp promove aulões de biologia, sessões de cinema, debates, atividades para a turma do Capinho, como é chamado o prédio onde estudam os alunos do ensino fundamental primeiro segmento, e também torneios de futebol. Aliás, a olimpíada do CAp é um evento que mobiliza toda a comunidade escolar e acontece no segundo semestre. Enfim, é uma ocupação de resistência mesmo, mas com a alegria, disposição e idealismo próprios dos adolescentes.
Mas neste sábado estava acontecendo também um outro evento: a assembleia dos pais!
Pois é, como estão os responsáveis dos 1.100 alunos da instituição? Divididos. Angustiados. Irritados. Impacientes. Revoltados. Cansados. Sim, percebi na fisionomia dos cerca de 60 presentes na assembleia esse misto de sentimentos. Uns defendem a greve. Outros querem as aulas de volta a qualquer custo. Outros pedem por essencialidades, como aulas para algumas séries consideradas prioritárias segundo suas opiniões parciais.
Conversei com um pai na saída. Desanimado, apesar de querer muito o retorno das aulas, ele acredita que isso ainda vai demorar. Após segundos de reflexão, fiz o seguinte questionamento: “se esquecermos os pais, os docentes e os alunos, e analisarmos a situação apenas como um cidadão comum, sem vínculo nenhum com a instituição, você voltaria de uma greve com menos garantias do que quando entrou? Lembrando que agora nem os salários estão garantidos.” Após um piscar de olhos, a resposta é taxativa: NÃO.
Mas e como ficam todos os envolvidos? Parados, inertes, aguardando que políticos inescrupulosos decidam o futuro das suas vidas, dos seus filhos, dos seus irmãos, dos seus amigos?
Confesso que saí de lá muito triste, contagiada pelo desalento daqueles pais que se reuniram em mais uma manhã de sábado, para tentar pensar juntos em maneiras de se fazerem notar pelas autoridades. Mas a demora proposital em atender ao mínimo necessário para que a instituição volte a funcionar, vai enfraquecendo o movimento e afastando até os mais convictos. Faz parte da estratégia de quem não tem o menor interesse na educação, como é o caso desse caótico governo do estado do Rio de Janeiro.
Porém, no domingo, quando meu filho e eu cuidávamos do terrário, elaborado por ele e seu grupo no ano passado e que ficou sob sua responsabilidade no final do ano letivo, tive um sopro de esperança ao constatar que o mesmo está cada dia mais vivo e lindo. Imediatamente disse a ele: “esse terrário é o símbolo da resistência da educação pública de qualidade do nosso estado”. “Por que, Mãe?”, perguntou. “Contrariando as expectativas, ele está resistindo e sabe por quê? (Me olhou com olhos curiosos) Estamos cuidando dele com muito carinho, porque queremos que ele prospere. Assim deveria ser tratada a educação, com carinho, cuidado e dedicação. Vamos fotografar e mandar para os seus amigos. Que tal?”
Enfim, depois de muito pensar, cheguei a conclusão de que só incomodando muito aos donos do poder é que aquelas pessoas, daquela escola de excelência, onde todos os anos milhares de pessoas sonham e lutam para entrar, vai conseguir alguma coisa. Só se unirem esforços e JUNTOS se fizerem presentes nas audiências públicas, nas visitas à ALERJ, nas assembleias… Somente JUNTOS conseguirão ter êxito em alguma coisa. Divididos serão apenas motivo de chacota e mais descaso por parte das autoridades.
E então? O que decidem? Deixar que um governo, que administra mal as contas públicas e levou o estado a esta crise absurda em todos os níveis e setores sele o seu destino? Vale a pena desistir depois de tantos sacrifícios e ceder a vitória a esses que estão no poder de passagem? Pensem nisso. Refresquem suas ideias e comecem a colocar a “boca no trombone”. Usem todos os canais de comunicação que puderem. Não desistam! Nosso estado precisa de mais escolas como o CAp. E não o fim dela.
Não permitam que este governo deixe como legado essa educação olímpica do descaso. Deixem vocês, estudantes, professores, funcionários e pais o legado de um dos mais importantes valores olímpicos: SUPERAÇÃO!
Boa sorte!
Maravilhosa leitura sobre toda conjuntura que estamos vivendo. Que saibamos reagir e resistir tal qual o terrário.
Fatinha, parabéns pelo seu empenho e dedicação a educação do seu filho e demais alunos do Cap-Uerj. Infelizmente, vivemos num lugar onde roubar o estado é esporte olímpico e o grandes campeões são o próprio governo. Para o povo, nem a arquibancada.
Bjs
Texto bem explicado é hora de unir forças para que as autoridades tomem cuidado com a educação.vão fazer feio para as pessoas que vêem para as olimpíadas.Já não basta de tantos problemas com as obras. Agora vão pagar que não se interessam com a educação
Excelente reflexão! Às vezes a vontade é de jogar a toalha, mas o instinto de mãe para que a justiça seja feita para o meu filho me faz ter as forças renovadas para ir à luta.
Perfeito Fatinha! Como sempre, colocando as palavras no pensamento exato, estamos entregues, mas precisamos superar e mostrar do que somos capazes! Estou passando pela primeira vez pelo descaso do governo no Ensino Estadual, sinto dizer, que fiquei várias vezes desanimada, mas precisamos erguer nossos filhos na luta! Muitos bjs e excelente leitura. Elisangela Morais
Fátima,adorei o texto, como sempre você passa a sua mensagem de maneira clara e reflexiva.
Como pai de aluno do Instituto de Aplicação Fernandes Rodrigues da Silveira, o CAP_Uerj, após todos esses meses de paralização das atividades, fico muito triste e aborrecido com todo esse descaso e pela indiferença das autoridades por essa situação. Travamos uma luta de titãs para legar aos nossos filhos, uma educação de qualidade que lhes fará toda a diferença em suas vidas. A Educação, assim como, saúde, segurança, transporte e habitação são condições básicas que um responsável ESTADO deve prover aos seus cidadãos. Afinal de contas, somos todos contribuintes dessa máquina que alimentamos diariamente com os nossos tributos. E somos muito bem cobrados por isso. No entanto, a contrapartida não é semelhante. Vivemos uma conjuntura lamentável num dos estados mais importantes da federaçao, o que nos deixa realmente indiguinados. Não obstante, como você aborda no seu texto coeso e esclarecedor, não podemos nos entregar. Temos o direito e a obrigação de reinvindicar por escolas públicas de excelencia e de qualidade como o CAP_UERJ, para os nossos filhos. É o mínimo que eles merecem.
Excelente post!